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segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Ser Mestiço é Legal IV (Final)

            O objetivo deste estudo e pesquisa é reunir informações e dados, antes já realizados, por professores, antropólogos, sociólogos e estudiosos do tema, e as que serão inseridas por mim, principalmente no período pós-abolição -  segundo o Labhoi (Laboratório de História Oral e Imagem) da Universidade Federal Fluminense (UFF) existem várias lacunas a serem preenchidas em relação a pesquisas sobre o cotidiano dos negros neste período -, em uma compilação de fácil leitura e ilustrações dos grandes negros, brancos e amarelos que juntos, denominados Mestiços, contribuíram e ainda contribuem para o desenvolvimento do Brasil, a serem distribuídos em instituições de ensino e cultura para jovens do ensino fundamental e médio. “... São objetivos específicos do Plano Nacional... Promover o desenvolvimento de pesquisas e produção de materiais didáticos e paradidáticos que valorizem, nacional e regionalmente, a cultura afro-brasileira e a diversidade.” Trecho do Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnicorraciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana (pág.24).
                     Através de essa documentação ilustrativa expor aos nossos jovens e crianças que a mestiçagem não é uma degeneração, e sim, motivo de orgulho, provocá-los a debaterem o pluralismo. Os portugueses chamavam de barrocas as pedras irregulares, barrocas - as pérolas irregulares, excessivas, esquisitas e errôneas. O barroco é considerado o movimento da arte de crise, e dessa e com essa crise chegamos a Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, um dos maiores representantes da arte plástica brasileira, filho de uma escrava com um mestre-de-obras português. Não fosse Castro Alves um mestiço, teríamos a beleza, a força e a dor nos versos de “Navio Negreiro”, que lhe concedeu o título de “O Poeta dos Escravos”? Quais seriam os percursos, se é que os existiriam, para fundar a Cia Rubens Barbot Teatro de Dança, se não fosse a coragem e o talento de Mercedes Baptista, a primeira bailarina negra do Teatro Municipal do Rio de Janeiro? A trajetória de Abdias Nascimento como Deputado Federal e Senador da República, nos presenteia com o nosso atual Ministro Joaquim Benedito Barbosa Gomes, Presidente do Supremo Tribunal Federal. Padre José Maurício Nunes Garcia, que teve como pais um alfaiate e uma filha de escravos, compositor brasileiro de música sacra que emocionou D. João VI, e com isso ganhou uma comenda do então príncipe, o que me faz acreditar que os príncipes têm excelente gosto musical, outro que também se rendeu a Terra Brasilis e seus encantos foi o príncipe Charles, da Inglaterra, quando, em 1978, em visita ao nosso país, não resistiu o charme e malemolência de Maria da Penha Ferreira, a Negra Pinah, passista da Escola de Samba Beija-Flor de Nilópolis, cena imortalizada na letra do samba da escola em 1983 “... Pinah, êêê Pinah, a cinderela negra que ao príncipe encantou, no carnaval com o seu esplendor...” Ops! O samba também é algo genuinamente brasileiro, exatamente porque é a junção de vários ritmos, e nem penso em discorrer sobre a nossa culinária agora, o parágrafo não terminaria nunca. Enfim, proporcionar material para que crianças, pré-adolescentes,  adolescentes e adultos negros, índios, afro-descendentes, brancos, amarelos e de todas as cores e crenças possam derrubar os muros da discriminação e conceitos primitivos e letais na construção de suas cidadanias.
            Pretendo que este estudo/pesquisa não passeie apenas no caráter relativo e dissertativo da história, espero que através de debates e conversas de campo (bem no estilo griot ²) com jovens de instituições acadêmicas e culturais, e, comunidades quilombolas e indígenas possa mapear o que, quem, como e em que elas se identificam e/ou necessitam saber da história do Brasil, para desenvolverem de fato sua cidadania, se sentirem de fato inseridos na sociedade, com abordagem principal na Região Sudeste do país. Expor e homenagear esses brasileiros que atuaram ou ainda atuam em diversas áreas, como na música, dança, pintura, literatura, nos três poderes, no teatro, cinema e TV, na medicina, no esporte, com grande maestria e saber. Proporcionar através desta compilação impressa e áudio book, material básico de estudo e pesquisa para montagens de peças teatrais, musicais, shows etc., todo produzido e encenado por jovens nestes espaços acadêmicos e culturais. Ainda, servir de base para debates e palestras em espaços como a FLIST (Festa Literária de Santa Teresa) e FLUPP (Festa Literária das UPP’s).
            Acredito que a informação clara e precisa seja um importante instrumento de desmistificação de momentos da história do Brasil, até bem pouco tempo divulgada e difundida nas escolas em material didático. Como exemplo, a Abolição da Escravatura, através da Lei Áurea, assinada pela Princesa Isabel até então vista como heroína do povo escravizado, e que foi tão bem relatada por Mary Del Priore em “O Castelo de Papel”, lançado recentemente pela Editora Rocco, onde percebemos a queda da heroína e o surgimento de uma mulher comum mais preocupada com a vida doméstica. “... É importante que se diga que (a Abolição) foi um processo, que começou por volta de 1870. Foi uma longa luta, que envolveu escravos, descendentes de escravos, a mudança da mentalidade em todo o país. Nada disso se faz da noite pro dia, é um acúmulo de tendências que levou à assinatura de papel... Ela teve inúmeras oportunidades de se manifestar. Em Recife, foi recebida por um monte de abolicionistas, inclusive mulheres; era um movimento que poderia ter esposado ou, ao menos, demonstrado simpatia... Fica bem demonstrado, por meio de vários documentos e frases dela, que detestava a vida política. Havia uma incompatibilidade com o projeto que lhe atribuíam. Não achei frase dela que demonstrasse qualquer interesse pelo assunto. Estava mais preocupada com a vida familiar, as gravidezes.” Matéria “Isabel: Uma princesa avessa à política” de Roberta Jansen, sobre o livro “O Castelo de Papel” de Mary Del Priore, do Jornal O Globo, 12/05/2013, pág.05, Caderno Especial.
           Desmistificando, conhecendo a história de pensadores, autores, políticos, formadores de opinião, artistas e a sociedade no todo que ajudaram e ainda ajudam a construir esta nação, em um futuro próximo talvez possamos ouvir os versos da canção “Navio Negreiro/Escravos” de Toni Vargas, tão bem executada pelo grupo vocal Cia DáNoCoro – Música e Cena – “...Escravo negro, escravo branco, somos todos violentados pelos mesmos senhores, que nos humilham indiferentes a raça ou credo, e nos colocam uns contra os outros para que nos destruamos...” e esses sejam apenas versos de uma história literalmente deixada no passado e não retratos da vida real do nosso presente.

² Griot – Personagem importante na estrutura social da maioria dos países da África Ocidental, cuja função primordial é informar, educar e entreter. Um guardião da tradição oral do seu povo.

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