Por Conceição Gomes
Ilustração - Marcelo Coelho |
Estava assistindo a reprise do Saia Justa com as poderosas e empoderadas Astrid Fontenelle, Mônica Martelli, Pitty, Gaby Amarantos, e a convidada era a Manu Gavassi. O papo das meninas estava super interessante, e dois pontos chamou minha atenção por falarem, de certa forma, direta e indiretamente sobre mim.
O primeiro ponto foi sobre lives,
canais nas redes sociais, seguidores, influenciadores, visualizações, curtidas
... enfim, quem explode, os top streamings; e o outro ponto foi o ócio
criativo.
Há algum tempo descobri que
quantidade não significa qualidade, números estratosféricos de visualizações
não significam que a postagem foi lida, assistida, ouvida ou absorvida, significam apenas que alguém clicou ali. Cada um foca, presta atenção naquilo que é de seu
interesse próprio ou comum.
Com a pandemia as lives
vieram com força total. No início era bem interessante. Com o passar do tempo
temos live de tudo e de qualquer coisa!! Desculpe a sinceridade: mas, que
infeeeeerrrrrnnooooo isso gente😈?! Não pelo assunto e/ou pessoas, mas é que
não dá tempo de você assistir a toda que interessa ou seja
necessária assistir. Isso sem falar nas travas que rolam na conexão, internet
lenta, pesada, insatisfatória, seu vizinho pegando carona no wi-fi 😡... São inúmeras causas de uma live ficar pela metade.
A Mônica (Martelli) ainda
comentou sobre isso: ‘Que legal ter live até de Dentista.’ Super
concordo com você Mônica, mas é com hora marcada? E eu espero que ele não
marque na hora da live da Teresa Cristina, porque aí dá ruim!
Todas abordaram pontos de
vista positivo para essa reinvenção humana durante e pós-pandemia. É extremamente
positivo toda sociedade poder se expressar e levar algum conhecimento para
outras pessoas. Entretanto, percebi o quanto o distanciamento social pode nos
deixar ‘jiboiando’ na frente da tela do computador ou celular. Me peguei
assistindo a uma live da NASA, em que fiquei minutos intermináveis
olhando para a Terra do espaço ... gente é relaxante 😒... tinha 303 mil views
...
Enfim, pós-pandemia não faço
ideia do que será a vida da gente sem tempo para assistir lives.
O outro ponto que elas
debateram foi o tal do ócio criativo, muito bem defendido pelo sociólogo
italiano Domenico De Masi, que criou o termo. Compreendi a tese dele que nada
mais é do que o óbvio: Se a gente não parar para olhar para o céu, só perceberemos
a chuva quando ela cair, ou seja, ficar parado não significa não produzir ou
perceber o mundo a sua volta, o que eu acho PERFEITO! Porém ... brasileiro é um
bicho esquisito!
Se você está lá, paradão,
olhando para o céu, você é vagabundo. Se você está assistindo a live da
NASA, você não está fazendo nada de útil. Para fazer parte do ‘meio’ você
precisa estar fazendo (é pra isso que serve o gerúndio, gente!!) mais de uma
coisa ao mesmo tempo, porque uma coisa só nesses inúmeros testes com que o facebook
inferniza a nossa página, significa que você é medíocre, limitado. Então, você
tem que fazer mil coisas para poder corroborar o tal ócio criativo. Se me ne
frega un cazzo cosi!😡
Mania que brasileiro tem de
colocar as pessoas em escaninhos, definindo quem é o quê, determinando quem faz
o quê ... O chinês Yuan San fez duas noites de live dele dormindo,
literalmente, e ganhou o respectivo em Real, o valor de 18.600,00. Agora me diz,
ele estava utilizando o direito dele do ócio criativo para ganhar dinheiro, ou
ele estava vagabundeando?
O que eu sei é que:
1 – Nunca trabalhei tanto na
minha vida como nessa gripezinha que nos colocou de ‘noventena’.
2 – Não peguei o COVID-19
(ainda, e espero nem chegar perto, se ele ainda tivesse 1,80cm, olhos cor de
mel 😎...) porque na infância usei muito a pasta de dente Kolynos que tinha
cloroquina.
3 – Um país consegue
sobreviver um mês sem Ministro da Saúde em plena pandemia.
4 – Laranja é a fruta mais
brasileira que existe, não importa o pomar de onde ela saiu.
5 – A Globo é muito, muito
PHODA conseguiu fazer o Japão cancelar as Olimpíadas.
6 – Fábio Assunção é Ifista.
Ifismo não é candomblecismo.
7 - Black Lives Matter
desde que o mundo é mundo, quando acabar o isolamento social e a vida voltar ‘à
normalidade’ elas ainda importarão para você? Qual atitude você tomará na sua
vida para mudar esta realidade de ódio, racismo e preconceito? Você que tem uma
vivência branca e postou #BlackoutTuesday, vai deixar eu falar de mim e do meu
povo, ou continuará falando POR mim e pelo meu povo para ganhar mais views
e eleições?
A vida é o que é e ponto. Uma
coisa invisível nos obrigou a diminuir a velocidade, a olhar para si e para o
outro, nem que seja através de uma live. Quantos likes e views
valem o meu trabalho? Para o youtube pelo menos mil. Tenho o poder de
influenciar alguém com o meu conteúdo? Quem sabe? Quem me lê, quem me ouve?
A Taís Araújo perguntou à
Ivete Sangalo numa live: Por que a Margareth Menezes não tinha o mesmo
sucesso que a Ivete? Eu pergunto: Por que a Zezeh Barbosa não fez o mesmo
sucesso que a Taís?
A saia injusta do racismo estrutural esteve presente na pré-pandemia, está na pandemia, e continuará no pós-pandemia? Acredito na ação individual formando o coletivo. E tal como Maya Angelou, ainda assim eu me levanto!
Você pode me riscar da História
Com mentiras lançadas ao ar.
Pode me jogar contra o chão de terra,
Mas ainda assim, como a poeira, eu vou me levantar.